Lei e regulamentação
A lei do aborto no Brasil
O aborto induzido no Brasil ainda é criminalizado, e punido com penas de 1 a 3 anos de prisão para a mulher grávida e de 1 a 4 anos para o médico ou qualquer outra pessoa que efetue o procedimento de interrupção da gravidez. Essa previsão legal está em vigor desde 1940 [11] e pode ser encontrada no art. 124 do Código Penal.
Exceções legais à penalização após um aborto no Brasil
Existem apenas três casos onde uma pessoa pode conseguir acesso aos serviços abortivos sem punição (art. 124-127:
Decreto Lei n° 2.848 de 07 Dezembro de 1940: Artigo 124 – 127
Embora o aborto seja legal com três exceções, as informações da revista feminista brasileira AzMina de outubro de 2020 indicam que vários hospitais deixaram de prestar o serviço de aborto.
De acordo com Norma Técnica: Atenção Humanizada ao Abortamento do SUS, é um dever do estado manter, em hospitais públicos, profissionais que realizem abortos, caso uma mulher precise destes serviços nas circunstâncias permitidas pela lei.
Fatos e números
Quantos abortos são feitos no Brasil?
Durante o primeiro semestre de 2020, apenas 1.024 abortos foram registrados no SUS (Sistema Único de Saúde). No mesmo período, o SUS atendeu 80.900 casos de complicações relacionadas a abortos inseguros, de acordo com o G1. É evidente que o número de pessoas que busca o serviço médico por complicações relacionadas ao aborto é consideravelmente maior do que o número de pessoas que consegue o serviço de forma legal.
no Brasil
Não há dados suficientes disponíveis para determinar quantos abortos são realizados no Brasil por ano; entretanto, é possível estimar que uma em cada cinco mulheres brasileiras que vivem em áreas urbanas tenha feito um aborto.
Pesquisas apontam que o aborto é uma experiência comum na vida reprodutiva de mulheres e meninas, mesmo que esta prática seja restrita. Embora as barreiras legais não afetem a decisão de fazer um aborto, os dados (e a falta deles) mostram como mulheres negras e indígenas são afetadas pela criminalização.
*Esta página apresenta dados de aborto somente para mulheres e meninas, pois as informações disponíveis geralmente não são separadas por gênero. Entretanto, o AbortionData.org reconhece essa limitação.
Opinião pública
O que os Brasileiros acreditam
De acordo com uma pesquisa divulgada pelo IPEC em setembro de 2022, a maioria dos entrevistados se opõe ao aborto, sendo a oposição composta principalmente por evangélicos, graduados do ensino fundamental e residentes do meio-oeste.
No entanto, uma parcela considerável da população é a favor, predominantemente entre os 16 e 24 anos, os estudantes universitários e as pessoas sem religião ou que não são evangélicas ou católicas.
Quem aborta?
Quem são as pessoas que solicitaram abortos legais?
Um estudo independente realizado por Debora Diniz e Marcelo Madeiro fornece dados demográficos sobre as mulheres que solicitaram abortos legais. Durante 2013 e 2015, eles analisaram 1.283 fichas médicas de mulheres que fizeram abortos legais em cinco serviços em cinco regiões do país. Fornecendo uma estimativa do número e do perfil demográfico das mulheres que solicitaram aborto no país [7].
Nesse estudo, a metodologia foi baseada no relatório fornecido pelo serviço de saúde pública. A fim de continuar a compreender quem está buscando e acessando serviços de aborto legal, é imperativo manter dados atualizados, e um registro completo [7].
Uma descoberta essencial do estudo realizado por Diniz e Madeiros (um dos estudos com maior compreensão das características demográficas das pessoas que buscam aborto no Brasil) foi que a maioria das mulheres que têm acesso a serviços de aborto legal são brancas. No entanto, de acordo com informações fornecidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, as mulheres negras representam o dobro do número de abortos inseguros.
Greice Menezes, na revista brasileira Azmina, explicou que as mulheres negras estão sub-representadas em relação ao acesso ao aborto legal devido a problemas relacionados ao racismo institucional [9].
Métodos de aborto
Quais são os serviços de aborto disponíveis no Brasil?
Como o contexto afeta o acesso ao aborto no Brasil?
Segundo um estudo realizado por Fusco e Andreoni, existe uma relação determinante entre o aborto e uma série de condições socioeconômicas e culturais. No caso brasileiro, as mulheres representam uma população em estado de desigualdade socioeconômica que se traduz em fatores como menor acesso à educação, moradia digna e métodos contraceptivos, entre outros. Além disso, o racismo estrutural, que coloca as mulheres negras sob maior vulnerabilidade, torna a situação ainda pior. Desta forma, as condições culturais, sociais e econômicas levam a uma falta de acesso ao sistema público de saúde, gerando riscos mais significativos de aborto inseguro [15].
O impacto da COVID-19
Como a pandemia influenciou o aborto no Brasil?
Aborto legal por telemedicina
No Brasil, o aborto por telemedicina está sendo adotado como uma solução para o isolamento em casos de gravidez após violência sexual. O programa foi iniciado pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas), no Hospital de Clínicas de Uberlândia.
Os serviços relataram que, em abril de 2021, 15 mulheres [1] terminaram sua gravidez usando seus serviços. Entretanto, ao contrário das denúncias de violência sexual, este número parece consideravelmente baixo.
O que não sabemos
A brecha Brasileira de dados
Embora o SUS colete dados gerais sobre aborto dentro do sistema de saúde, muitas informações importantes só são fornecidas graças a ONGs (organizações não-governamentais). Entretanto, para traçar um quadro completo da situação do aborto no Brasil, os estudos exigiriam a resposta às seguintes perguntas.
Sources
Sources & Partners
[1] Acento (2021) El aborto legal por telemedicina se abre paso en Brasil. Acento https://acento.com.do/actualidad/el-aborto-legal-por-telemedicina-se-abre-paso-en-brasil-8938183.html Jan, 28 2022.
[2] Aiken, A., Lohr, P. A., Lord, J., Ghosh, N., & Starling, J. (2021). Effectiveness, safety and acceptability of no-test medical abortion (termination of pregnancy) provided via telemedicine: a national cohort study. BJOG : an international journal of obstetrics and gynaecology, 128(9), 1464–1474. https://doi.org/10.1111/1471-0528.16668
[3] CLACAI (2017) Mifepristona y misoprostol en seis paises de America Latina.
[4] Departamento de Saúde Comunitária, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE – Brasil (W.F., L.L.C.); Maternal and Child Epidemiology Unit. London School of Higiene and Tropical Medicine, UK (C.M.); Hospital Geral César Cals. Fortaleza, CE – Brasil (J.A.M.P.); Maternidade Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE – Brasil.
[5] Diniz, D., Medeiros, M. (2012) Itineraries and methods of illegal abortion in five Brazilian state capitals Ciência & Saúde Coletiva, 17(7):1671-1681.
[6] Diniz, D., Medeiros, M., Madeiro, A., Universidade de Brasília, Brasil, Universidade de Brasília, Brasil, Universidade Estadual do Piauí, Brasil, 2017. Pesquisa Nacional de Aborto 2016. Ciênc. Saúde Coletiva 22, 653–660. https://doi.org/10.1590/1413-81232017222.23812016
[7] Madeiro, A.P., Diniz, D., 2016. Serviços de aborto legal no Brasil – um estudo nacional. Ciênc. Saúde Coletiva 21, 563–572. https://doi.org/10.1590/1413-81232015212.10352015
[8] Freitas, J. E. P. D., 2020. Abortion Is A Fundamental Right—Brazil Is Failing To Fully Recognise It. Human Rights Pulse, 19 Septiembre.
[9] Folego, T. (2017) “Criminalização do aborto mata mais mulheres negras”. Revista Azmina https://azmina.com.br/reportagens/precisamos-falar-de-aborto-e-como-ele-mata-mulheres-negras/ Jan, 28 2022.
[10] Key Facts on Abortion, n.d. . Amnesty https://www.amnesty.org/en/what-we-do/sexual-and-reproductive-rights/abortion-facts/ Jan, 28 2022.
[11] Hardy, E., & Rebello, I. (1996). La discusión sobre el aborto provocado en el Congreso Nacional Brasileño: el papel del movimiento de mujeres. Cadernos de Saúde Pública, 12, 259-266.
[12] Fonseca, W., Misago, C., Correia, L. L., Parente, J. A., & Oliveira, F. C. (1996). Determinantes do aborto provocado entre mulheres admitidas em hospitais em localidade da região Nordeste do Brasil. Revista de Saúde Pública, 30(1), 13-18.
[13] Sethna, C., & Davis, G. (Eds.). (2019). Abortion across borders: Transnational travel and access to abortion services. JHU Press.
[14] Murray, L., & Khan, N. (2020). The im/mobilities of ‘sometimes-migrating’for abortion: Ireland to Great Britain. Mobilities, 15(2), 161-172.
[15] Fusco, C. L., & Andreoni, S. (2012). Unsafe abortion: social determinants and health inequities in a vulnerable population in São Paulo, Brazil. Cadernos de Saúde Pública, 28, 709-719.