Aborto no Brasil

O aborto no Brasil é considerado legal em três circunstâncias: estupro, perigo iminente para a pessoa grávida e anencefalia. 1 em cada 5 mulheres brasileiras já passou por pelo menos um aborto até os 40 anos.

Lei e regulamentação

A lei do aborto no Brasil

Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque: Pena — detenção, de um a três anos.

CP — Decreto Lei n° 2.848 de 07 Dezembro de 1940: Artigo 124

O aborto induzido no Brasil ainda é criminalizado, e punido com penas de 1 a 3 anos de prisão para a mulher grávida e de 1 a 4 anos para o médico ou qualquer outra pessoa que efetue o procedimento de interrupção da gravidez. Essa previsão legal está em vigor desde 1940 [11] e pode ser encontrada no art. 124 do Código Penal.

Existem apenas três casos onde uma pessoa pode conseguir acesso aos serviços abortivos sem punição (art. 124-127:

Gravidez causada por estupro — a pessoa não precisa fornecer Boletim de Ocorrência
Perigo iminente à vida da mulher grávida — um profissional médico precisa testemunhar a causa
Caso de anencefalia (por decisão do Supremo Tribunal Federal) — um profissional médico precisa testemunhar a causa

Decreto Lei n° 2.848 de 07 Dezembro de 1940: Artigo 124 – 127

Embora o aborto seja legal com três exceções, as informações da revista feminista brasileira AzMina de outubro de 2020 indicam que vários hospitais deixaram de prestar o serviço de aborto.

Adopciones para adopción de 2020 en Brasil, sin penalización del aborto.

De acordo com Norma Técnica: Atenção Humanizada ao Abortamento do SUS, é um dever do estado manter, em hospitais públicos, profissionais que realizem abortos, caso uma mulher precise destes serviços nas circunstâncias permitidas pela lei.

Fatos e números

Quantos abortos são feitos no Brasil?

Durante o primeiro semestre de 2020, apenas 1.024 abortos foram registrados no SUS (Sistema Único de Saúde). No mesmo período, o SUS atendeu 80.900 casos de complicações relacionadas a abortos inseguros, de acordo com o G1. É evidente que o número de pessoas que busca o serviço médico por complicações relacionadas ao aborto é consideravelmente maior do que o número de pessoas que consegue o serviço de forma legal.

No primeiro semestre de 2020foram realizados 1.024 abortos através do sistema legalforam notificadas 80.900 emergências relacionadas a complicações pós-aborto no Brasil

Não há dados suficientes disponíveis para determinar quantos abortos são realizados no Brasil por ano; entretanto, é possível estimar que uma em cada cinco mulheres brasileiras que vivem em áreas urbanas tenha feito um aborto.

Pesquisas apontam que o aborto é uma experiência comum na vida reprodutiva de mulheres e meninas, mesmo que esta prática seja restrita. Embora as barreiras legais não afetem a decisão de fazer um aborto, os dados (e a falta deles) mostram como mulheres negras e indígenas são afetadas pela criminalização.

“Não há, nos sistemas de informação de saúde brasileiros, qualquer dado sobre aborto inseguro. As bases de dados oficiais de saúde não permitem ter uma estimativa do número de abortos que ocorrem no Brasil. Os dados disponíveis se restringem aos óbitos por aborto e às internações por complicações de aborto no serviço público de saúde.”

B. B. Cardoso, F. M. S. B. Vieira and V. Saraceni

*Esta página apresenta dados de aborto somente para mulheres e meninas, pois as informações disponíveis geralmente não são separadas por gênero. Entretanto, o AbortionData.org reconhece essa limitação.

Opinião pública

O que os Brasileiros acreditam

De acordo com uma pesquisa divulgada pelo IPEC em setembro de 2022, a maioria dos entrevistados se opõe ao aborto, sendo a oposição composta principalmente por evangélicos, graduados do ensino fundamental e residentes do meio-oeste.

No entanto, uma parcela considerável da população é a favor, predominantemente entre os 16 e 24 anos, os estudantes universitários e as pessoas sem religião ou que não são evangélicas ou católicas.

Quem aborta?

Quem são as pessoas que solicitaram abortos legais?

Um estudo independente realizado por Debora Diniz e Marcelo Madeiro fornece dados demográficos sobre as mulheres que solicitaram abortos legais. Durante 2013 e 2015, eles analisaram 1.283 fichas médicas de mulheres que fizeram abortos legais em cinco serviços em cinco regiões do país. Fornecendo uma estimativa do número e do perfil demográfico das mulheres que solicitaram aborto no país [7].

Nesse estudo, a metodologia foi baseada no relatório fornecido pelo serviço de saúde pública. A fim de continuar a compreender quem está buscando e acessando serviços de aborto legal, é imperativo manter dados atualizados, e um registro completo [7].

Uma descoberta essencial do estudo realizado por Diniz e Madeiros (um dos estudos com maior compreensão das características demográficas das pessoas que buscam aborto no Brasil) foi que a maioria das mulheres que têm acesso a serviços de aborto legal são brancas. No entanto, de acordo com informações fornecidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, as mulheres negras representam o dobro do número de abortos inseguros.

Greice Menezes, na revista brasileira Azmina, explicou que as mulheres negras estão sub-representadas em relação ao acesso ao aborto legal devido a problemas relacionados ao racismo institucional [9].

Métodos de aborto

Quais são os serviços de aborto disponíveis no Brasil?

Métodos legais disponíveis
Outros métodos

Aborto com Misoprostol em hospital

O Misoprostol é um medicamento registado no Brasil, utilizado para aborto legal, indução do parto com o feto vivo, e indução de feto morto ou retido.

Aspiração Manual a Vácuo

A Aspiração Manual por Vácuo está disponível nos centros médicos para interromper legalmente as gravidezes até às 14 semanas.

Aspiração por Vácuo Eléctrico

A aspiração de vácuo eléctrica está disponível em algumas partes do país. Os registos indicam que 3% dos abortos legais foram realizados com este método [5].

Telemedicina

No Brasil, o aborto por telemedicina está foi adotado como uma solução para o isolamento em casos de gravidez após violência sexual. O programa foi iniciado pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas), no Hospital de Clínicas de Uberlândia.

Os serviços relataram que, em abril de 2021, 15 mulheres [1] terminaram sua gravidez usando seus serviços. Entretanto, ao contrário das denúncias de violência sexual, este número é consideravelmente baixo.

Telemedicina, COVID-19 e violência sexual

No Brasil, o aborto por telemedicina é oferecido pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas) no Hospital de Clínicas de Uberlândia.

Métodos de Aborto no Brasil fora dos serviços jurídicos?

Restrições legais ao aborto dificultam o acesso aos métodos de seguros. No Brasil, as pessoas que requerem um aborto são forçadas a procurar clínicas privadas que oferecem o serviço clandestinamente, comprar Mifepristona e/ou Misoprostol no mercado paralelo, ou usar métodos populares tradicionais que não são reconhecidos como seguros pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Autogestão do Misoprostol vaginal e oralmente

De acordo com a Pesquisa Nacional sobre Aborto 2016, 48% das mulheres entrevistadas usam o Misoprostol. O método mais comum foi o uso de Cytotec, quatro pílulas, e terminaram o processo em clínicas [5].

O caso de Fortaleza

Foi relatado em um estudo realizado em Fortaleza, Brasil, que entre 1 de outubro de 1992 e 30 de setembro de 1993, 4.359 pacientes foram tratados por condições relacionadas ao aborto. Este estudo revelou que 66% das mulheres usaram o Misoprostol como indutor de aborto, e a maioria eram mulheres jovens [12].

Telemedicina e o aborto através de comprimidos

A telemedicina é uma maneira eficaz e segura de fazer abortos com Misoprostol e Mifepristone[2]. Algumas organizações internacionais oferecem estes serviços às mulheres que vivem em ambientes restritivos, como o Brasil. Em 2015, aproximadamente 416.000 mulheres fizeram um aborto, e 48% dos casos tiveram abortos com pílulas de Misoprostol [6].

Telemedicina by Women on Web

O site Women on Web, que oferece serviços de telemedicina no mundo todo, publicou 1.086 histórias de mulheres brasileiras que fizeram um aborto seguro com pílulas.

Viajar para obter acesso ao aborto seguro

As pessoas que buscam aborto foram forçadas a viajar para ter acesso aos serviços devido a restrições legais e à falta de provedores de assistência médica. De acordo com a pesquisa realizada por Azmina e Gênero e Número, 13 estados não possuem uma clínica que ofereça abortos legais, fazendo com que muitas mulheres viajem para a cidade mais próxima para obter serviços de aborto.

Há necessidade de uma pesquisa mais detalhada para entender a experiência de viajar para abortar. Para aqueles que procuram abortos, é essencial estudar as barreiras logísticas, o custo e a carga emocional que esta experiência representa.

Milhas Pela Vida das Mulheres
Viajar para um aborto com Milhas Pela Vida das Mulheres

Milhas Pela Vidas Mulheres é uma organização sem fins lucrativos que fornece informações e assistência financeira às mulheres que buscam serviços de aborto. As viagens são realizadas dentro Brasil, ou, em alguns casos, para o exterior do país para ter acesso aos serviços de aborto.

De acordo com esta organização, 70% das mulheres que requerem serviços de aborto desconhecem que têm o direito ao aborto legal, já que suas situações são contempladas nas hipóteses legais.

Mesmo que viajar para o aborto não seja uma prática nova no Brasil [13], seus dados indicam que viajar é uma alternativa eficaz aos métodos de aborto inseguros. Entretanto, é uma alternativa que envolve riscos, despesas, cargas emocionais, estigma, vergonha, tempo consumido e negociações familiares [14]. Além disso, nem todos os indivíduos podem arcar com esta alternativa ou podem tirar alguns dias de folga para viajar.

Contexto social

Como o contexto afeta o acesso ao aborto no Brasil? 

Segundo um estudo realizado por Fusco e Andreoni, existe uma relação determinante entre o aborto e uma série de condições socioeconômicas e culturais. No caso brasileiro, as mulheres representam uma população em estado de desigualdade socioeconômica que se traduz em fatores como menor acesso à educação, moradia digna e métodos contraceptivos, entre outros. Além disso, o racismo estrutural, que coloca as mulheres negras sob maior vulnerabilidade, torna a situação ainda pior. Desta forma, as condições culturais, sociais e econômicas levam a uma falta de acesso ao sistema público de saúde, gerando riscos mais significativos de aborto inseguro [15].

O impacto da COVID-19

 Como a pandemia influenciou o aborto no Brasil?

No Brasil, o aborto por telemedicina está sendo adotado como uma solução para o isolamento em casos de gravidez após violência sexual. O programa foi iniciado pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas), no Hospital de Clínicas de Uberlândia.

Os serviços relataram que, em abril de 2021, 15 mulheres [1] terminaram sua gravidez usando seus serviços. Entretanto, ao contrário das denúncias de violência sexual, este número parece consideravelmente baixo.

O que não sabemos

A brecha Brasileira de dados

Embora o SUS colete dados gerais sobre aborto dentro do sistema de saúde, muitas informações importantes só são fornecidas graças a ONGs (organizações não-governamentais). Entretanto, para traçar um quadro completo da situação do aborto no Brasil, os estudos exigiriam a resposta às seguintes perguntas.

Quantos abortos inseguros são realizados no país?
Quantos abortos são feitos em áreas rurais?
Quantas pessoas viajam para fazer um aborto?
Quantas pessoas queer fazem aborto?
Quantas pessoas fazem abortos completos com pílulas?

Sources

Sources & Partners

[1] Acento (2021) El aborto legal por telemedicina se abre paso en Brasil. Acento https://acento.com.do/actualidad/el-aborto-legal-por-telemedicina-se-abre-paso-en-brasil-8938183.html Jan, 28 2022.

[2] Aiken, A., Lohr, P. A., Lord, J., Ghosh, N., & Starling, J. (2021). Effectiveness, safety and acceptability of no-test medical abortion (termination of pregnancy) provided via telemedicine: a national cohort study. BJOG : an international journal of obstetrics and gynaecology128(9), 1464–1474. https://doi.org/10.1111/1471-0528.16668

[3] CLACAI (2017) Mifepristona y misoprostol en seis paises de America Latina.

[4] Departamento de Saúde Comunitária, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE – Brasil (W.F., L.L.C.); Maternal and Child Epidemiology Unit. London School of Higiene and Tropical Medicine, UK (C.M.); Hospital Geral César Cals. Fortaleza, CE – Brasil (J.A.M.P.); Maternidade Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE – Brasil.

[5] Diniz, D., Medeiros, M. (2012) Itineraries and methods of illegal abortion in five Brazilian state capitals Ciência & Saúde Coletiva, 17(7):1671-1681.

[6] Diniz, D., Medeiros, M., Madeiro, A., Universidade de Brasília,  Brasil, Universidade de Brasília,  Brasil, Universidade Estadual do Piauí,  Brasil, 2017. Pesquisa Nacional de Aborto 2016. Ciênc. Saúde Coletiva 22, 653–660. https://doi.org/10.1590/1413-81232017222.23812016

[7] Madeiro, A.P., Diniz, D., 2016. Serviços de aborto legal no Brasil – um estudo nacional. Ciênc. Saúde Coletiva 21, 563–572. https://doi.org/10.1590/1413-81232015212.10352015

[8] Freitas, J. E. P. D., 2020. Abortion Is A Fundamental Right—Brazil Is Failing To Fully Recognise It. Human Rights Pulse, 19 Septiembre.

[9] Folego, T. (2017) “Criminalização do aborto mata mais mulheres negras”. Revista Azmina https://azmina.com.br/reportagens/precisamos-falar-de-aborto-e-como-ele-mata-mulheres-negras/ Jan, 28 2022.

[10] Key Facts on Abortion, n.d. . Amnesty https://www.amnesty.org/en/what-we-do/sexual-and-reproductive-rights/abortion-facts/  Jan, 28 2022.

[11] Hardy, E., & Rebello, I. (1996). La discusión sobre el aborto provocado en el Congreso Nacional Brasileño: el papel del movimiento de mujeres. Cadernos de Saúde Pública12, 259-266.

[12] Fonseca, W., Misago, C., Correia, L. L., Parente, J. A., & Oliveira, F. C. (1996). Determinantes do aborto provocado entre mulheres admitidas em hospitais em localidade da região Nordeste do Brasil. Revista de Saúde Pública, 30(1), 13-18.

[13] Sethna, C., & Davis, G. (Eds.). (2019). Abortion across borders: Transnational travel and access to abortion services. JHU Press.

[14] Murray, L., & Khan, N. (2020). The im/mobilities of ‘sometimes-migrating’for abortion: Ireland to Great Britain. Mobilities15(2), 161-172.

[15] Fusco, C. L., & Andreoni, S. (2012). Unsafe abortion: social determinants and health inequities in a vulnerable population in São Paulo, Brazil. Cadernos de Saúde Pública, 28, 709-719.

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